Jorge Bergoglio não usou palavras próprias, mas recorreu a um documento da Igreja latino-americana. Mas a citação soou como uma nova estocada do presidente da Conferência Episcopal, cardeal Bergoglio, no Governo. Foi quando advertiu sobre o risco de uma parcialização da luta a favor dos direitos humanos, uma das principais bandeiras do kirchnerismo. A reportagem é de Sergio Rubin e está publicada no jornal Clarín, 01-10-2009. A tradução é do Cepat.
Fonte: UNISINOS
A observação – tomada do documento da Conferência do Episcopado Latino-americano e Caribenho de 1992 em Santo Domingo – foi feita por Bergoglio durante uma jornada sobre políticas públicas – “As dívidas sociais de nosso tempo” –, organizada pela Universidade do Salvador e a Universidade Carlos III, de Madri. O texto faz parte de seu discurso inaugural, com referências críticas à situação social. Como quando disse que “a perda do sentido da justiça e a falta de respeito para com os demais se aprofundaram e nos levaram a uma situação de iniquidade”.
O encontro – realizado no Hotel Alvear – reuniu dirigentes políticos como Francisco De Narváez, Raúl Baylac, Jorge Vanossi e Jorge Telerman e o secretário-geral da prefeitura de Buenos Aires, José Scioli, e empresários como Cristiano Ratazzi. Entre os expositores, a senadora Chiche Duhalde reclamou uma “autocrítica de todo o peronismo por sua atuação desde a retomada democrática”; o presidente da UOCRA, Gerardo Martinez, destacou o papel solidário do sindicalismo a partir da expansão dos serviços de seu grêmio, e Tomáz Sánchez de Bustamante (OSDE) falou da responsabilidade social que cabe às empresas.
Também fez uma exposição o rabino Sergio Bergman, que – fiel à sua visão crítica do Governo e o seu estilo eloquente – pediu um maior compromisso cívico “para que não terminemos sendo como a Venezuela”, em referência ao governo de Hugo Chávez.
Em sua alocução, seguida pelo auditório que encheu dois salões do Hotel, Bergoglio disse que “a maior imoralidade (da dívida social), dizem os bispos, reside no fato de que isso ocorre em um país que tem condições objetivas para evitar ou corrigir os danos, mas que lamentavelmente pareceria optar por agravar ainda mais as desigualdades”.
Nessa linha, sublinhou que “não podemos responder com verdade ao desafio de erradicar a exclusão e a pobreza, se os pobres seguem sendo objeto, destinatários da ação do Estado e de outras organizações em um sentido paternalista e assistencialista, e não sujeitos onde o Estado e a sociedade produzem as condições sociais que promovem e tutelam seus direitos e lhes permitam ser construtores de seu próprio destino”.
Para Bergoglio, “a crise econômico-social e o consequente aumento da pobreza tem suas causas em políticas inspiradas em formas de neoliberalismo que consideram os lucros e as leis de mercado como parâmetros absolutos em detrimento da dignidade das pessoas e dos povos”.
E disse que “nos acostumar a viver com excluídos e sem equidade social, é uma grave falta moral que deteriora a dignidade do homem e compromete a paz social”. Também se referiu à fuga de capitais. “Pensamos que há em torno de 150 bilhões de dólares de argentinos no exterior, sem contar os que estão no país fora do circuito financeiro, e nos informam que se vão cerca de dois bilhões de dólares a mais por mês”, assinalou. “O que podemos fazer para que sejam postos a serviço do país em ordem a saldar a ‘dívida social’ e produzir as condições para um desenvolvimento integral”, concluiu.