06/04/2009

Um cristianismo de instituição e de protesto

O jornalista e ensaísta francês Jean-Claude Guillebaud, em artigo para o jornal La Croix, 03-04-2009, defende que Bento XVI está sendo vítima de uma campanha midiática "muitas vezes injusta e às vezes até hostil". "A Igreja, às vezes, nos desconcerta ou nos revolta, mas continuamos sendo os seus filhos", afirma. A tradução é de Moisés Sbardelotto. Jean-Claude Guillebaud é autor de inúmeros livros. Alguns estão traduzidos para o português, como A Tirania do Prazer e A Refundação do Mundo.
Fonte: UNISINOS

É preciso fazer com que a perturbação, o tormento, o sofrimento que habitam muitos católicos desde o fim de janeiro sejam afastados, retirados do tumulto cotidiano, se esfriem. Só a tomada de distância e a calma podem permitir que os vejamos mais claramente. No fundo, a nossa perturbação é muito mais difícil de ser vivida por ser ambivalente. Estamos, sobretudo, envergonhados – é um eufemismo – pelo que parece ser um endurecimento dogmático do Vaticano. Além das desastrosas confusões de comunicação, vemos despontar um pontificado mais tradicionalista, e os temores expressados aqui e ali sobre um possível esquecimento do Vaticano II não são absurdos.

Ao mesmo tempo, porém, estamos aflitos por ver Bento XVI vítima de uma campanha midiática muitas vezes injusta e às vezes até hostil. Portanto, mesmo criticando certas posições da Cúria romana, também recebemos sobre nós as flechas que são lançadas contra o papa. Oh, aqueles humoristas ferozes que ouvíamos gritar da manhã à noite! E eis-nos aqui, então, nós, leigos católicos, em uma bela situação! Alguns se sentem tentados a deixar a Igreja silenciosamente; outros gostariam, pelo contrário, que o linchamento mortal do soberano pontífice fosse suspenso. A nossa dor, como Jano, tem, portanto, duas faces. Mas tanto por um lado quando pelo outro, nos faz mal. É possível imaginar uma forma de sair dela?

Creio que sim. Um pouco de distância histórica, sobretudo, nos permitirá lembrar uma evidência. Não é a primeira vez que alguns católicos se encontram em problemas com Roma. Em 17 séculos, pode-se até dizer que isso ocorreu muito frequentemente. Os contemporâneos de Pio IX, no século XIX, não ficaram todos seduzidos pelo seu Syllabus, que denunciava rigidamente as ideias modernas. Do mesmo modo, certos contemporâneos de Pio XII sentiam falta de Pio XI e de sua condenação explícita do nazismo ("Nós somos espiritualmente semitas"). Enfim, o papado é – também – uma instituição humana muito imperfeita. Então, para retomar uma expressão famosa de Francisco de Sales, "onde quer que haja um homem, há um produto de um homem". Enquanto tal, a instituição é submetida legitimamente à crítica dos seus filhos.

Antes de ver uma catástrofe nesses divórcios esporádicos, é melhor compreender que eles estruturam toda a história do cristianismo. Ao lado de um cristianismo de potência e de instituição, sempre houve um cristianismo de protesto, que nunca poupou a própria instituição. Ora, os protestantes eram filhos da Igreja, era da Igreja que procediam. Durante séculos, a história do cristianismo se organizou em torno dessa estranha – e magnífica – sinergia entre "protesto evangélico" e "organização eclesial".

A palavra viva, a que mantém o "fogo" evangélico, circulou mais frequentemente nas margens da Igreja, quando não em reação ao conservadorismo ou a esclerose desta última. São os protestantes e os místicos que transmitiram o fogo da Palavra. Às vezes, foram mantidos às margens. O seu profetismo incandescente corria o risco, é verdade, de incendiar a bela organização clerical. Mas esses testemunhos essenciais poderiam ter existido sem a instituição? Certamente não. É na mesa comum que eles se nutriram primeiramente. É no seio da Igreja, e por meio dela, que tiveram acesso à palavra evangélica. A sua revolta – a de Francisco de Assis ou a de Teresa D'Ávila – era a de uma criança que se rebela contra a autoridade de sua mãe.

A extraordinária longevidade do cristianismo encontrou aí a sua origem: uma instituição periodicamente despertada pelos próprios dissidentes. Sem o protesto que vem das margens, a mensagem teria perdido o seu sabor ou teria até se gastado. Mas sem a Igreja, não teria sido transmitida. Dissidência e instituição são como os lados direito e avesso de uma mesma verdade em movimento.

Uma instituição, qualquer que seja, sempre é tentada a obedecer a uma síndrome de rigidez e de "perseverar no seu ser". A sua natural inclinação consiste em opor a própria imobilidade ao movimento, a preferir a atenção à conservação em vez do progresso, e a ordem social mais do que a liberdade. Ao mesmo tempo, a Igreja ainda é a nossa casa comum. Mesmo sendo dura e disciplinar, ela ainda é uma academia onde a nossa fé se forma e se educa. Ela enfrentou mil vezes as tentações sectárias, heréticas ou intolerantes. Ela acumulou, no curso dos séculos, um corpus de reflexão, de argumentação, de experiência que seria uma loucura jogar no esquecimento. De um século ao outro, ela propõe uma propedêutica (do grego, paideuein: ensinar) da fé.

A nossa fé precisa da Igreja. Senão, o crer não seria outra coisa do que uma paixão incerta que saltita e se diverte antes de correr ao abrigo de uma seita, de uma tribo ou de um grupo extremista. "Não se conjuga o verbo crer – escrevia Emmanuel Levinas – na primeira pessoa do singular, mas sim do plural".

A Igreja, às vezes, nos desconcerta ou nos revolta, mas continuamos sendo os seus filhos.